DEVO CHAMAR A TODOS DE "IRMÃOS"?
Existe um costume no meio evangélico e entre alguns
católicos que é o de chamar qualquer um que se identifique como cristão de "irmão". É comum
encontrarmos debates nas redes sociais nos quais alguém que se diz "crente",
"cristão"
ou "evangélico"
continue a ser chamado de "irmão"
por seus interlocutores mesmo depois de ter negado as verdades cardeais do
cristianismo ou de estar claramente escandalizando os que acompanham a conversa
com ideias fora do contexto bíblico.
Outras vezes o termo "irmão"
é usado, não como forma de dizer que ambos comungam da mesma fé, mas como forma
de criar distanciamento, como as pessoas costumam fazer numa briga ou
bate-boca, quando passam a chamar o adversário de "senhor" ou "senhora".
Políticos são especialistas nisso. Basta ver um vídeo de briga entre
parlamentares para ver como eles carregam no uso do "Vossa Excelência", não como um pronome para denotar um
elevado grau de respeito, como ensina o dicionário, mas como preâmbulo para as ofensas e palavrões que se seguirão.
O que dizem as Escrituras sobre nossa maneira de tratar
aqueles que se dizem irmãos, porém negam
a sã doutrina ou são insubordinados às decisões da igreja ou assembleia? Ao
revelar os princípios que deveriam reger a autoridade do Senhor na assembleia
Jesus deixou claro que existiria um momento quando um insubordinado dentre os
irmãos deixaria de ser tratado como "irmão"
para ser tratado como incrédulo ou infiel.
"Ora, se teu irmão pecar contra
ti, vai, e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste a teu irmão; mas, se não te ouvir, leva ainda contigo um
ou dois, para que pela boca de duas ou três testemunhas toda a palavra seja
confirmada. E, se não as escutar, dize-o à igreja; e, se também não escutar a
igreja, considera-o como um gentio e
publicano." (Mat 18:15-17).
É disto que Paulo fala em 1 Coríntios 5 ao tratar da excomunhão
de um que estava contaminado com pecado moral. Ele devia ser excluído da
comunhão (excomungado) à mesa do Senhor e ser tratado como alguém que estava
fora. Obviamente o catolicismo e o protestantismo acabaram distorcendo essa
ação disciplinatória e consideraram a excomunhão como uma exclusão do corpo de Cristo, o que é impossível ao homem
fazer, já que nenhum verdadeiro membro de Cristo
pode ser arrancado do seu corpo que é a igreja. A questão aqui é
apenas no âmbito administrativo e da comunhão prática na terra, não no céu.
"Já por carta vos tenho escrito, que não vos associeis com os que
se prostituem; isto não quer dizer absolutamente com os devassos deste mundo,
ou com os avarentos, ou com os roubadores, ou com os idólatras; porque então
vos seria necessário sair do mundo. Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão,
for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador;
com o tal nem ainda comais. Porque,
que tenho eu em julgar também os que estão de fora? Não julgais vós os que
estão dentro? Mas Deus julga os que estão de fora. Tirai,
pois, dentre vós a esse iníquo." (1 Co 5:9-13).
Repare que ele faz uma ressalva no tratamento para com os
incrédulos, chamados aqui de "devassos
deste mundo", por saber muito bem que seria impossível viver no mundo
separado fisicamente deles. Afinal, precisamos estudar, trabalhar e conviver
com colegas, chefes e parentes incrédulos e não há como fugir disso. Os
sistemas monásticos importados pelo catolicismo das religiões orientais tentam
fazer uma separação física dos incrédulos isolando seus religiosos em mosteiros
inacessíveis. Mas a doutrina dos apóstolos ensina que o tratamento com rigor
deve ser reservado aos que "dizendo-se
irmãos" viverem em pecado que desonre o Nome que carregam.
Ações assim nunca são por falta de amor (como também não é a
disciplina de um filho), mas têm por objetivo fazer com que o transgressor se
envergonhe de seu modo de ser e possa se arrepender de seus caminhos e ser
restaurado à comunhão com os irmãos. Mas enquanto isso não acontece ele não
deve de maneira nenhuma ser chamado de "irmão"
e todo contato que vá além do absolutamente necessário deve ser evitado. "Porque
o Senhor corrige o que ama, E açoita a qualquer que recebe por filho... E, na
verdade, toda a correção, ao presente, não parece ser de gozo, senão de
tristeza, mas depois produz um fruto pacífico de justiça nos exercitados por
ela." (Hb 12:6-11).
Por muitos de nós termos vindo de uma tradição católica,
somos sempre muito "bonzinhos"
na hora de tratar com as pessoas por acreditarmos que "todos somos irmãos" ou que "não devemos julgar". Porém a Palavra de Deus ensina
outra coisa. Devemos sim julgar as más ações das
pessoas, suas doutrinas, o que falam,
apesar de não podermos julgar o coração. O Senhor ensinou seus discípulos a
tomarem cuidado com o "fermento"
ou doutrina dos fariseus, e também a não agirem do modo como eles agiram, o que
por si só prefigura fazer um julgamento.
O julgamento pode ser tanto individual quanto da assembleia.
Uma vez que tivermos claro diante de nós que estamos lidando com alguém que, "dizendo-se irmão",
comporta-se de maneira contrária às escrituras, devemos nos apartar do tal e
também deixá-lo de chamar de "irmão".
Como o Senhor ensinou, devemos considerá-lo "gentio
e publicano", que era a forma de um judeu enxergar um não judeu ou impuro. Essa separação é
profilática, isto é, tem por objetivo evitar contaminação e permitir que
fiquemos preparados "para toda boa obra" (2 Tm 2:21), o que não acontece
se estivermos ligados às pessoas erradas. "Não sabeis que um pouco de fermento
faz levedar toda a massa?" (1 Co 5:6).
Evidentemente somente "o
Senhor conhece os que são seus", porém a parte que me diz respeito é
agir de acordo com o que diz a continuação da passagem: "Qualquer que profere o nome
de Cristo aparte-se da iniquidade. Ora, numa grande casa não somente há vasos
[pessoas] de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra,
outros, porém, para desonra. De sorte que, se alguém se purificar [separar]
destas coisas, será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e
preparado para toda a boa obra." (2 Tm 2:19-21).
Vamos imaginar uma aplicação prática dessa questão de chamar
ou não de "irmão" alguém
que esteja causando escândalo, ou por negar doutrinas fundamentais da Bíblia, ou às vezes até por ser legalista ao extremo como os
fariseus e querer colocar as pessoas debaixo de um jugo. A
partir do momento em que ele faz isso em um bate-papo numa rede social e você
continua a chamá-lo de "irmão",
até para tentar apaziguar os ânimos ou ser educado, a impressão que dará aos
incrédulos que estiverem acompanhando a conversa é que você e ele são farinha do mesmo saco. Aí o incrédulo irá pensar: "É isso que é ser cristão? É
isso que é ser 'irmão'? Muito obrigado, mas quero ficar bem longe desse
evangelho".