Jesus amou e morreu por pessoas. Jesus ressuscitou por
pessoas. Ele deu sua vida em resgate de homens e mulheres que estavam perdidos
em seus próprios delitos e pecados. Compadeceu-se de homens e mulheres que
estavam condenados à morte por suas transgressões. Cristo amou e se entregou em
sacrifício na cruz por causa da rebeldia e da desistência humana de andar,
comungar e obedecer ao Criador. O Filho de Deus doou a vida eterna a pessoas
que o receberam como Senhor e Salvador. No mistério e profundidade de sua
graça, ele nos olhou como pessoas e ovelhas, dando-nos vida – e vida em
abundância.
Como pastor, Jesus deu e dá sua vida pelas ovelhas e por seu
rebanho. Somos, como igreja, comunidade e ajuntamento de pessoas que estavam
prisioneiras em seus próprios medos, incertezas e angústias. Éramos cativos de
mente e coração. O desespero e a incerteza diante da morte e da fragilidade da
experiência humana nos atormentavam. Assim, pessoas comuns – com suas
histórias, marcas, heranças e contextos –, através de seu Espírito, têm escrito
uma nova história onde fé, convicção, certeza e esperança se instalaram.
Tal compreensão pode ser libertadora nos dias de hoje,
quando tantas pessoas, equivocadamente, são transformadas em consumidores pelo
mercado da fé. De forma sutil e sorrateira por um lado, e agressiva por outro,
essa dinâmica tomou conta da mentalidade evangélica no Brasil e no mundo.
Devotos se transformaram apenas em consumidores e mantenedores desse mercado,
travestido até na forma de igrejas locais coorporativas e estruturas
empresariais. A lógica e o discurso são os mesmos do mercado: cantamos sobre a
marca Jesus, escrevemos sobre ela, lançamos produtos temáticos. Já há até
estudos de marketing acerca de características de gênero, classe social, faixa
etária e necessidades de determinados grupos sendo usados para a criação de
igrejas.
Grandes conglomerados comerciais de literatura e música
chamadas de cristãs estão sendo engolidos com voracidade por empreendedores
que, até bem pouco tempo, nem se importavam com a existência do tal segmento
evangélico. Só que o Jesus de muitos pregadores, cantores, corporações e
empresários não é necessariamente aquele apresentado na Bíblia, o Jesus eterno
e histórico, o Emanuel, o Deus que se fez homem; aquele que veio como escravo e
servo para proporcionar ao caído salvação através da cruz, para anunciar o
Reino de Deus e trazer graça, senhorio e juízo. Esse Jesus midiatizado não é o
Jesus que trouxe ensino e valores de amor, compaixão, paz e justiça, e que nos
deixou a missão de lhe fazer discípulos e seguidores.
O pastor Jesus, pastor de ovelhas, de gente, trata a cada um
com pessoalidade, dignidade e importância. Ele nos ama como pessoas, ouve
nossos relatos, está atento à nossa realidade e história. O pastor Jesus
alimenta o faminto, sacia o sedento, limpa o imundo, cura os feridos, protege e
conduz ovelhas. Jesus nos ajuda a dar significado ao pastoreio e a contextualizar
esta vocação do acolhimento, do cuidado, do ensino e da formação espiritual. Os
pastores não precisam perder o caminho da fé, assim como qualquer cristão em
outra área profissional ou de atuação – uma fé que ganha contornos práticos de
uma vida de serviço e de trabalho digno, mediante o suor do rosto. Fé no Deus
trino, e não no mercado que fala sobre ele.
Muitos dirão que comércio pode ser feito com ética e
honestidade, visando a legítimos propósitos. É verdade. Mas a chance de o
mercado tirar do centro a essência e o alvo do Evangelho, de sua mensagem e
obra, são muito grandes. Pastores, escritores e artistas cristãos produzem em
escala industrial coisas que se tornarão, invariavelmente, produtos de consumo:
mensagens, livros, CDs, ensinos, palestras, DVDs... Tudo tem seu preço, e tudo
acaba alimentando esse mercado da fé. Numa linha muito tênue, o negócio se
torna a pessoa, o pregador, o cantor, o escritor, sua corporação, sua visão,
sua estrutura criada. Assim, o que fazem torna-se um fim em si mesmo, e não um
meio para atingir algo mais elevado.
No genuíno pastoreio, contudo, precisamos ser cuidadosos e
íntegros. Não se pode perder de vista que cuidamos de pessoas, e não de
consumidores. O mercado não é o nosso negócio, muito menos o propósito do chamado
e vocação pastoral. Somos cuidadores e referenciais de Jesus para o rebanho de
Deus, ajudando ovelhas a permanecerem no Caminho.
Por Nelson Bomilcar